terça-feira, 20 de junho de 2017

Controvérsia em torno de vídeo de “exorcismos” dos Arautos do Evangelho

Arautos do Evangelho. Foto: Blog Acadêmico Arautos

REDAÇÃO CENTRAL, 19 Jun. 17 / 07:00 pm (ACI).- O vídeo de uma reunião entre sacerdotes dos Arautos do Evangelho e seu fundador Mons. João Sconamiglio Clá Dias gerou controvérsia depois que o vaticanista Andrea Tornielli o divulgou, suscitando o rechaço da Associação de Fiéis, que argumenta que o vídeo nunca devia ter sido difundido por ser parte de “documentos restritos” só a seus membros.

A existência do vídeo se tornou conhecida dias depois da renúncia de Mons. Clá Dias como Superior Geral no dia 2 de junho, divulgada através de uma carta no dia 12 de junho. A decisão de deixar o cargo já havia sido tomada há tempo, como explicou ao Grupo ACI na sexta-feira, 16, Pe. César Diez, sacerdote dos Arautos do Evangelho.

O vídeo mostra uma reunião entre o fundador e um grupo de sacerdotes onde foi lido o suposto diálogo que um sacerdote dos Arautos havia tido com um suposto demônio durante um “exorcismo”. O encontro de Mons. Clá com os presbíteros teria acontecido depois da viagem do Papa Francisco ao México em fevereiro de 2016, ao ser mencionado por um dos presentes.

No diálogo, o suposto demônio atribui poderes sobrenaturais a Plínio Corrêa de Oliveira, fundador de Tradição, Família e Propriedade (TFP), associação que foi dividida após a sua morte e da qual nasceu os Arautos do Evangelho, fundados por Mons. Clá e reconhecidos pelo Pontifício Conselho para os Leigos em 2001.

Os Arautos do Evangelho consideram que Plínio Corrêa “teve um importante papel” na formação religiosa, filosófica e cultural de Mons. João Clá.

Além disso, no vídeo o suposto demônio também afirma que Plínio Corrêa, no céu, “incentiva” a morte do Papa Francisco.

Pe. César Diez reconheceu a autenticidade do vídeo e de outro no qual Mons. Clá teria praticado um exorcismo a uma jovem membro dos Arautos. “Evidentemente esses vídeos são autênticos”, afirmou, entretanto, criticou que foram divulgados, por serem “documentos restritos à associação”.

Segundo o sacerdote, os comentários críticos sobre esses vídeos “foram inteiramente extrapolados e comentados de uma forma que não é a real”. Indicou que esses “fazem parte de uma comissão de estudos precisamente desse tipo de fenômenos (...). No fundo, vê-se que existe uma intencionalidade não boa nessa divulgação”, afirmou.

“Essas são reuniões que nós tivemos sobre esses fenômenos que se veem aí refletidos para estudá-los e, como estavam como tema de estudo, ainda não havia conclusões”.


“Evidentemente, isso foi feito dentro de uma reunião completamente descontraída com pessoas que sabem do que estão tratando”, acrescentou o sacerdote, que assegurou que “exorcismos propriamente nós não fazemos. O que se faz muitas vezes são bênçãos. Bênção de libertação”.

Nesse sentido, disse que o vídeo no qual Mons. Clá praticaria um exorcismo a uma jovem “mostra precisamente que não se está usando nenhum ritual e o que está sendo feito são orações, está dando uma bênção etc., porque é uma bênção de libertação, não é uma exorcismo propriamente”.

O vídeo

No vídeo se vê Mons. Scognamiglio Clá Dias tomar algumas folhas com a transcrição do que seria um diálogo entre um sacerdote dessa associação e o demônio durante o que teria sido uma sessão de “libertação”.

No texto, lido por Pe. Luiz Francisco Beccari, compreende-se por uma das perguntas do sacerdote que as questões feitas ao demônio são feitas “por ordem de Mons. Clá” e servem apenas para “confirmar” o que os membros desta associação supostamente creem e aceitam.

O sacerdote usa uma fórmula que não é a aprovada pela Igreja para o ritual de exorcismos: “A maldição de Monsenhor João caia sobre a tua cabeça!”, repreende ao diabo, que teria revelado que “Nossa Senhora está muito empenhada para que os membros do grupo se comprometam a servir a Mons. João, renunciando à própria vontade para fazer a do monsenhor”.

No texto, lê-se que Plínio Correa “está sentado à direita da Virgem, ele também acomodado em um trono e tem todo o poder. Dona Lucília (a mãe de Plínio) está à sua esquerda, um pouco mais abaixo e colabora para tudo o que o filho Plínio constrói”.

Correa tem “o controle sobre o mundo porque ele é a ordem do universo”, indica-se na transcrição, diante do espanto dos sacerdotes que exclamam palavras como “Fenomenal! Impressionante!”.

Além disso, o diabo afirma que Dona Lucília conversa do além com o fundador dos Arautos. No vídeo essas afirmações não são negadas por Mons. Clá.

Do mesmo modo, o suposto demônio afirma que Plínio Corrêa tem poder sobre o clima e é responsável “do aumento do calor”. Também assegura que “um meteorito irá cair no oceano na frente dos Estados Unidos, no Atlântico, e a América do Norte vai desaparecer”.

No vídeo de mais de uma hora, o sacerdote pergunta sobre a Santa Sé e o Papa Francisco. “O Vaticano? É meu, é meu! Faz tudo o que eu mando, é um tolo!”, afirma o demônio, gerando risadas dos sacerdotes e do próprio Mons. Clá.

“Obedece a tudo que mando”, acrescenta o demônio, o qual assegurou que “o Papa vai morrer em um tombo” e que “o doutor Plínio está incentivando a morte” do Papa. Nesse momento, os sacerdotes também exclamam “fenomenal”, enquanto Mons. Clá sorri.

Para concluir, diz-se ainda que o demônio não tem poder sobre os Arautos porque são consagrados a Plínio Corrêa de Oliveira.

Intervenção do Vaticano?

Em um artigo publicado em ‘Vatican Insider’, o vaticanista Andrea Tornielli afirmou que a Santa Sé “colocou em marcha” uma investigação sobre essa associação e que estaria sendo liderada por Cardeal brasileiro João Braz de Avis, prefeito da Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e Sociedades de Vida Apostólica. “Sobre isso não temos oficialmente nenhum comunicado”, assinalou ao Grupo ACI Pe. César Diez.

Tornielli, que advertiu que os vídeos também demonstrariam que os Arautos “usam rituais de exorcismo compilados por eles mesmos”, indicou que “entre as razões da investigação está o que o sociólogo Massimo Introvigne define como ‘uma espécie de culto secreto e extravagante a uma espécie de trindade composta por Plínio Corrêa de Oliveira, sua mãe Dona Lucília, e o próprio monsenhor Clá Dias’”.

“Sobre esse culto secreto, que na opinião de alguns teria ido muito além do mero culto da personalidade, já tiveram oportunidade de escrever vários ex-membros”, acrescentou o vaticanista.

Entretanto, Pe. César Diez disse que os comentários sobre um “culto secreto” “é como querer criar uma espécie de ambiente meio raro”.

Nos Arautos do Evangelho “nunca se fez nada fora dos parâmetros que a Igreja manda e, sim, tem-se uma devoção ao senhor Plínio e a sua mãe dona Lucília”, afirmou.

Em um comunicado adicional enviado ao Grupo ACI, os Arautos do Evangelho rechaçaram o artigo de Andrea Tornielli, qualificaram-no de “camaleão” e perguntaram se sua intenção é “criar um cisma na Igreja”.

A associação o acusa de usar “denúncias antigas” contra Plínio Corrêa, “sobre a veneração que muitos tinham em vida, e a devoção privada a sua mãe, Dona Lucília”. “Agora, Mons. João Scognamiglio Clá Dias (...) é o alvo dos mesmos ataques” com acusações já “contestadas e devidamente refutadas segundo os ditames da mais estrita doutrina católica”, afirmou.

Sobre o conteúdo do vídeo, disseram que “o objetivo da reunião registrada foi simplesmente o intercâmbio de impressões sobre certos fenômenos preternaturais, em um ambiente familiar ameno e descontraído”.

“Apesar disso, algumas mãos criminais, ainda desconhecidas, decidiram maliciosa e inconsequentemente divulgar seu conteúdo a um público que, em sua maioria, não tem conhecimentos teológicos suficientes para se formar um juízo adequado sobre seu conteúdo. Não foi difícil, portanto, criar confusão em suas mentes”.

“Por que o Sr. Tornielli não procurou os Arautos do Evangelho para esclarecer o assunto? (...) Estará atuando o Sr. Tornielli sozinho? Não sabemos”, afirma o comunicado, no qual se acrescenta que, “sem prejuízo dos próprios direitos, estão dispostos sempre a acolher com benevolência a retratação dos caluniadores e perdoá-los sinceramente, pois não guardam nenhum ressentimento”.

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