sexta-feira, 30 de novembro de 2018

Pedofilia: ações concretas vindas do Vaticano?

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Saiba o que esperar do evento que poderá traçar rumos para que não se repitam abusos sexuais envolvendo sacerdotes e religiosos católicos.
Papa discursa durante a abertura do sínodo para os jovens, em outubro de 2018.
Papa discursa durante a abertura do sínodo para os jovens, em outubro de 2018. (Reuters)
Por Mirticeli Dias de Medeiros*

O mês de fevereiro de 2019 promete. Entre os dias 21 e 24, o Papa Francisco receberá, no Vaticano, os presidentes das conferências episcopais de todo o mundo, os quais, juntos, discutirão os escândalos dos abusos sexuais na Igreja. É a primeira vez que acontece um evento dessa magnitude para tratar de um problema específico.

O pontífice reconheceu que não basta confiar na máquina da cúria romana para a resolução do problema, uma vez que tal enfrentamento exige a ação concreta daqueles que estão em contato direto com o povo: os bispos em suas respectivas dioceses. Os prelados, durante a estadia em Roma, serão auxiliados pela comissão de combate à pedofilia criada por Francisco, a qual é presidida pelo arcebispo de Boston (EUA), Sean Patrick O’Malley - que, curiosamente, não participará do evento e preferiu não se pronunciar sobre o motivo da sua ausência. Quem assumirá o seu lugar na tarefa de coordenar o encontro será o jesuíta Hans Zollner, presidente do centro de proteção de menores, instalado na Universidade Gregoriana de Roma desde de 2014, e o padre que se encarregou de visitar, nos últimos anos, mais de 40 conferências episcopais em todo o mundo para aplicar medidas de proteção, tornando-se, assim, um dos maiores especialistas na matéria.

O episcopado católico é convidado a dar respostas concretas a um problema que, há anos, destrói a vida de milhares de famílias em todo o mundo, além de levar ao descrédito a política de combate à pedofilia que os últimos papas prometeram adotar. Tal convocação é uma medida de emergência motivada, em grande parte, pela crise da igreja nos Estados Unidos e no Chile: não dá para negar. E também porque, dessa vez, os protagonistas desse colapso moral não são somente os padres abusadores, mas os bispos que acobertaram esses criminosos. Podemos dizer que, acima de tudo, trata-se de uma crise do episcopado católico: uma das maiores desde o pós-guerra. Agora, cabe a Papa Francisco pagar a conta do fruto mais amargo do clericalismo que ele tanto condena e o qual, mesmo após o apelo do Concílio Vaticano II, enraizou-se nos mais diversos setores do catolicismo.

Em entrevista ao site americano Crux, a irlandesa Marie Collins, uma das vítimas que chegou a integrar a comissão de combate à pedofilia criada por Francisco, explicou o que já passou da hora de a Igreja traçar uma linha de ação concreta para chegar à raiz do problema. Ela cita três pontos que, se executados, demonstrariam o quanto a Igreja pretende agir “além do discurso” durante o encontro com os bispos do ano que vem.

“Deveriam colocar em prática uma política universal de salvaguarda em todas as entidades eclesiais do mundo, alinhada com a ‘tolerância zero’ prometida por Papa Francisco [...]. Os participantes também deveriam chegar à decisão de estabelecer uma política de responsabilização de todos os líderes da Igreja no tocante à gestão dos casos de abusos de menores. Em terceiro lugar, eles deveriam discernir quais mudanças são necessárias em relação ao direito canônico para facilitar a introdução dessas mudanças de salvaguarda e responsabilização”, ressaltou.

Já o arcebispo de Chicago (EUA), cardeal Blasé Joseph Cupich, em entrevista ao mesmo jornal, prometeu que essa reunião será o início de uma reforma mundial cujas iniciativas acontecerão em nível regional e nacional.

 “Trata-se de resolver um problema global e fortalecer o nosso compromisso como Igreja, de modo que possamos estabelecer a capacidade de resposta, de responsabilidade e transparência. Devemos encontrar um modo de constatação global das falhas passadas e apontar soluções que visem o futuro”, enfatizou.

*Mirticeli Dias de Medeiros é jornalista e mestre em História da Igreja pela Pontifícia Universidade Gregoriana de Roma. Desde 2009, cobre primordialmente o Vaticano para meios de comunicação no Brasil e na Itália, sendo uma das poucas jornalistas brasileiras credenciadas como vaticanista junto à Sala de Imprensa da Santa Sé.

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