sábado, 17 de março de 2018

Suicídio anunciado

domtotal.com
Ao se recusar a investir em educação, o Brasil acabou sem dinheiro para investir em presídios.
Favelada e preta, nascida na favela da Maré, Marielle nadou contra todas as marés.
Favelada e preta, nascida na favela da Maré, Marielle nadou 
contra todas as marés. (Reprodução)
Por Celso Adolfo*

O Rio tem inimigos temíveis, e um deles é ele próprio. Quando, nos 1980, aparece Darcy Ribeiro com a ideia dos Cieps, de dificílima e lenta execução, o sonhador mineiro não conseguiu ir longe. Afinal, ele vinha da turma que combateu a ditadura de 64 e a imprensa comprometida com aquilo não gostava dele nem de Brizola. A Globo, o poder mais visível, partiu pra cima daquele governo, exibindo – por que é fácil – as feias faces da cidade maravilhosa. Brizola, Darcy e o Rio perderam a briga. Hoje chegamos aonde Darcy Ribeiro temia: - Como não gastamos com escolas, professores etc, não temos dinheiro para presídios.

A ideia dos CIEPs era, sim, um excelente projeto de educação para o Rio e que poderia ser replicado Brasil afora. Chegou a ser ensaiada em Belo Horizonte quando Darcy Ribeiro tomou parte do governo Newton Cardoso, Pelas características pouco abonáveis daquele período, restou dos sonhos e inteligência de Darcy Ribeiro uma edificação na Av. Avenida Cristiano Machado, que a população apelidou de Forno de Assar Criança. Existe ainda. A menos que tenham tomado medidas importantes, continua assando.

Quanto ao JN, de nada adianta fazer matéria longa com a melhor foto de Mariella. Até nisso deram sorte: preta bonita, foi fácil enquadrar uma boa imagem na tela e “sofrer” como sofremos.

Favelada e preta, (detesto a falsidade “morador de comunidade”, “afrodescendente”), Marielle lutava contra todas as marés (sem trocadilho). E é claríssimo que gente assim nunca terá apoios do tipo que a Globo já deu para Collor, pra ficar num exemplo que ela mesma destruiria quando lhe conviesse.

Já sabemos qual imprensa jamais entrará na luta pela diminuição das estúpidas diferenças sociais que, mal foram abordadas, hoje nos arruínam um pouco mais. Mais entrado na vida e já sabendo como economizar minh’alma, do fundo do coração, com toda ingenuidade que me cabe nesta única passagem pelo universo, eu suplico à deusa Rede Globo, em nome de Jesus, de São Sebastião e de Fernando Collor que ela ajude a Maré e as centenas de favelas do Rio e do Brasil na eleição de um vereador, um deputado, um político do tipo que que foi executado hoje. Aí haveria sinceridade na cobertura que o JN fez neste doloroso 15/03/2018, caprichando na comoção ante a execução de Marielle Franco.

Já que a iniquidade infesta o ar de todos nós, quem sabe o poderoso Golem da velha imprensa ajude a eliminar tal veneno e não se limite ao uso das comoções para gerar capas e manchetes barulhentas, como repetem agora?

*Celso Adolfo, violonista e compositor.

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