segunda-feira, 3 de abril de 2017

Leme, flor na estufa: uma paixão pelo bairro do Rio de Janeiro

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A partir do Leme conheci o Rio de fato e por princípio e por causa do Leme me tornei um carioca honorário, até porque fui concebido aqui perto.
Leme, é o bairro onde sei que caminharam juntos Paulo Mendes Campos e Clarice Lispector.
Leme, é o bairro onde sei que caminharam juntos Paulo Mendes Campos e Clarice Lispector.
 (Fernando Frazão/ Agência Brasil)
Por Ricardo Soares

Leme, Rio de Janeiro. Há muito tempo sou apaixonado pelo bairro, começo ou  fim de Copacabana, dependendo da perspectiva geográfica. Poderia dizer ao olhar hoje o lugar “Ai de ti Leme” como Rubem Braga fez com Capacabana. Mas, na verdade , nada digo pois não existe um “Ai de ti” sem um “Ai de nós”.

Muitas vezes para mim o Leme me pareceu uma abstração, uma flor na estufa, um lugar por onde vago quando me afligem as aflições. No Leme amei, sorri, chorei, bebi, comi , tomei chuva e sol na cara. Comi biscoito Globo e tomei mate doce com ou sem limão. A partir do Leme conheci o Rio de fato e por princípio e por causa do Leme me tornei um carioca honorário, até porque fui concebido aqui perto.

Se falo do bairro com tanta intimidade é também porque nele morei quase dois anos alternando poucas vindas a São Paulo. Mas nem queria vir tanto nesse período inebriado de Leme e de bons projetos que eu estava. Mas voltei para uma realidade mais dura e paulistana que incluiu antes breve passagem por Angola . Mas isso é outra prosa.

A prosa agora, nesse voo de ponte aérea que me leva de novo ao Leme, é o bairro onde sei que caminharam juntos Paulo Mendes Campos e Clarice Lispector , por acaso dois dos meus autores favoritos.Imagino-os conversando- quiçá se beijando- diante da bela igrejinha de Nossa Senhora do Rosário na rua General Ribeiro da Costa ou andando, vagarosos,  pelo caminho dos pescadores com o mar encapelado logo abaixo. Imagino a cena sem a mesma competência de uma crônica de Paulo Mendes Campos ou um conto de Clarice. Mas imagino.

Hoje vou pouco ao Leme. Menos do que gostaria.Mas o Leme mora dentro de mim e em mim aflora quando eu preciso. Felizes o que ali são residentes como o casal de queridos amigos que me recebe ou vizinhos que tive e que se perderam com o tempo. Associo o lugar a otimismo, a um sorriso , às “boas coisas da vida” para citar aqui outra crônica de Rubem Braga.

Longe de mim a pretensão de escrever a história do bairro ou uma percepção original da paisagem e geografia do lugar. Mas meus dedos estão orfãos dos anéis que o Leme sempre me deu. O Leme sempre enfeitou minha vida. Não sei se a terminarei morando no Leme, com vista para o mar como sugere o final de um romance que escrevi esse ano e ainda não publiquei. Mas confesso que acho a imagem aprazível e poética até porque enseja um paradoxo. Quanto mais penso na poesia de morrer no Leme mais acho que é uma delícia viver.

Viva para sempre o Leme.

Ricardo Soares é escritor, diretor de tv, roteirista e jornalista. Publicou 7 livros, dirigiu 12 documentários. Escreve às segundas e quintas no DOM TOTAL.

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