terça-feira, 4 de abril de 2017

'A flor da liberdade em nosso olhar'

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As juventudes não perdem de vista o horizonte de uma vida melhor e mais possível.
Educafro visa inserir e manter pessoas negras e de baixa renda nas universidades.
Educafro visa inserir e manter pessoas negras e de baixa renda nas universidades. (Educafro)
Por Tânia da Silva Mayer*

Ao falarmos de juventudes, não há como não recordar da belíssima canção Esperança jovem, do poeta Zé Vicente. Nela, o poeta exalta a gana dos e das jovens de construir um futuro livre das mazelas sociais e dos opressores do povo. As juventudes, reunidas nos lugares que ocupam, fazem do tempo presente o seu tempo de construir uma história jovem e bonita, sem os problemas de agora. De olho no presente e nos desafios que devem ser enfrentados, as juventudes não perdem de vista o horizonte de uma vida melhor e mais possível. Por isso, seu grito que ecoa na sociedade e na Igreja é pela justiça e pela paz, o caminho mais seguro para construir o futuro tão sonhado.

Nessa perspectiva é que as juventudes da Educafro se reuniram no último final de semana para refletir, debater e articular ações que visam à garantia de seus direitos. A Educafro Minas, integrada à rede de Educação e cidadania de negros, negras e pessoas da camada popular, com representatividade nos Estados de Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo, é um projeto afirmativo, gerenciado e apoiado pelos Franciscanos da Província Santa Cruz, que visa inserir e manter pessoas negras e de baixa renda nas universidades, por meio de pré-vestibular e pré-Enem comunitários. Em Minas, a Educafro está presente em diversas cidades, articulada em núcleos que contam com o voluntariado de professores e professoras, que, além de ensinarem conteúdos formais, ajudam a despertar a consciência dos e das jovens para temas afins ao movimento negro, tais como racismo, gênero, direitos humanos, meio ambiente, etc. As aulas tornam-se espaços de crescimento humano, cultural e cidadão.

O Encontro de Núcleos da Educafro Minas deste ano foi promovido pelo Núcleo Ação e Ousadia, do Centro Social Antonieta Fage – CESAF, no bairro Vila Primavera, em Ibirité. Há anos, o Núcleo Ação e Ousadia é um espaço alternativo para os e as jovens da Vila, que confrontados pelos muitos riscos sociais que os cercam, reanimam a esperança pelo ingresso na universidade e por uma vida mais digna. O CESAF, entidade sem fins lucrativos, cujas ações são voltadas para crianças, adolescentes, jovens e mulheres, é a “casa” para que estes sonhos sejam sonhados e se tornem uma realidade na vida dos estudantes. Desde seu início, dezenas de jovens que passaram pelo Ação e Ousadia se tornaram profissionais de excelência, comprometidos com suas funções e com a construção de uma sociedade mais justa para todos.

O Encontro deste ano teve como tema: “Juventudes e Educação: mãos unidas na construção de um País possível”. Ao redor dessa temática, os cento e dez participantes puderam construir uma macro visão da situação sociopolítica do Brasil, por meio de análises de conjuntura. Em Oficinas temáticas sobre o meio ambiente, raça, juventude e violência, gênero e drogas, eles propuseram caminhos possíveis para superar e eliminar problemas comuns que os cercam. Os participantes ainda construíram uma mesa de debates sobre o “novo Ensino Médio” e as suas consequências para o ingresso e permanência do povo negro e pobre nas Universidades, realçando os seríssimos retrocessos nos direitos conquistados nos últimos anos. Momento ímpar do encontro contou com o testemunho dos ex-alunos dos núcleos Educafro, que partilharam com os atuais sua trajetória de vida e estudos, bem como tudo o que tiveram de superar para realizarem seus sonhos. Uma caminhada ao Parque Estadual da Serra do Rola Moça encerrou o Encontro. Além de conhecerem o Parque e a sua rica flora e fauna, ouviram uma palestra promovida por um integrante do Movimento Rola Moça Sempre Viva, em defesa da Serra do Rola Moça, que é constantemente objeto de interesse de mineradoras e das imobiliárias.

Tal como outrora, as juventudes trazem consigo muitos medos e sombras, que puderem ser partilhados e socializados nos grupos de trabalho e nas conversas entre um café e outro. Mas como marca peculiar dessas pessoas, os sonhos, as utopias e a esperança por um País possível acende uma chama nos corações dos que colocam a vida em primeiro lugar e exorta que os e as jovens não sejam desprezados na construção da nova sociedade. As juventudes presentes no Encontro mostraram que não estão apáticas ao caos, pelo qual a sociedade brasileira está passando hoje. E como nunca, seus gritos são pelo respeito aos direitos duramente conquistados pelos seus antecessores. E se em alguns lugares a vida vai mal, as juventudes reunidas deixaram seu recado à Vila e o levaram na bagagem para suas cidades: mesmo em dias de outono, há primavera nas flores da liberdade em cada olhar.

*Tânia da Silva Mayer é mestra e bacharela em Teologia pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia – FAJE; Graduanda em Letras pela UFMG. É editora de textos da Comissão Arquidiocesana de Publicações, da Arquidiocese de Belo Horizonte. Escreve às terças-feiras. E-mail: taniamayer.palavra@gmail.com

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