terça-feira, 28 de março de 2017

A greve enquanto grito do empregado por melhores condições de trabalho

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A tentativa de conciliação é obrigatória, para deflagrar a greve deverá haver autorização por assembleia geral.
Para que uma greve não seja abusiva, é necessário que antes dela as partes tenham tentado solucionar o conflito.
Para que uma greve não seja abusiva, é necessário que antes dela as partes 
tenham tentado solucionar o conflito. (Wilson Dias/ABr)
Por Daniela Rodrigues Machado Vilela*

Trata-se o movimento grevista de uma forma de mobilização social coletiva, é a insatisfação demonstrada de cada um e de todos. O homem que vive em um tempo e sob certas condições de trabalho que lhe são desfavoráveis reage em busca de mudança desta conjuntura e a greve é instrumento posto a serviço do trabalhador nesse sentido.

O movimento grevista, também chamado paredista, quer demonstrar sua força contra a opressão do poder do capital. Através deste, o obreiro pressiona por melhores condições de trabalho, se liberta, parcialmente, do poder do empregador para dar seu grito de insatisfação. Trata-se de uma forma legítima de resistência, pois expressa a união coletiva dos trabalhadores que objetivam condições mais aprazíveis e dignas em sua relação laboral.

Através da eclosão da greve o empregado quer questionar, repensar questões e propor novas condições em seu contrato de trabalho. Quer romper com a sua insatisfação, construir novos direitos e depois voltar à normalidade, mas quer voltar percebendo que suas condições de labor melhoraram. Na greve como na vida se quer desabafar, falar e gritar, romper com a insatisfação, pontuar o que desagrada para depois voltar à “normalidade”, mas de forma mais qualitativa, busca-se o equilíbrio de forças se não ideal ao menos o possível na relação capital-trabalho.

O grevista tem como escopo romper a prestação de trabalho para demonstrar a importância desta. Como diz o dito popular “só se dá valor quando se perde”. Quer o empregado mostrar ao empregador, seu patrão, que seu trabalho faz falta, pois, se o empregador objetiva lucrar, sem trabalho feito não há lucro possível.

A greve é forma de diálogo social entre a sociedade, os trabalhadores e os empregadores. A greve não pode durar eternamente, de outro modo, deixa de ser greve e vira abandono de emprego. É momento de fôlego, de respirar, uma pausa e não um ponto final, busca-se por meio dela entendimento, cabendo a cada parte expor o que quer, ceder e negociar dentro dos seus parâmetros e anseios, a fim de que tudo volte à normalidade. A parede é assim derrubada, o contrato de trabalho retoma o seu curso e as partes retornam à vida mais tranquilas, o empregado porque viu sua demanda discutida e em parte obteve êxito, o empregador porque tendo cedido em alguns pontos sabe que o empregado voltará ao trabalho mais bem-disposto. A greve é política e se bem utilizada apazigua os ânimos das partes envolvidas no contrato de trabalho.

Para que uma greve não seja abusiva, é necessário que antes dela as partes tenham tentado solucionar o conflito. É o que diz a OJ 11 da SDC do TST: “é abusiva a greve levada a efeito sem que as partes hajam tentado, direta e pacificamente, solucionar o conflito que lhe constitui o objeto”, ou seja, a tentativa de conciliação é obrigatória, para deflagrar a greve deverá haver autorização por assembleia geral. Como dito anteriormente greve pressupõe diálogo anterior e durante em busca de solucionar o conflito e voltar à regularidade.

A Constituição brasileira de 1988 em seu artigo 9º diz que “é assegurado o direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender”. A greve é regulamentada também pela Lei 7.783/89. O artigo 6º dessa legislação prescreve direitos e deveres dos grevistas. Ou seja, no movimento paredista como em qualquer situação da vida têm-se de respeitar deveres e em contrapartida existem direitos.

Em princípio, a greve é situação de caráter privado. No que se refere ao serviço público, está assegurada pela Constituição Federal no artigo 37, VII. Estando proibida na lei a greve de militares. Contudo, a norma constitucional remete a lei posterior sua regulamentação, uma lei complementar. Assim, a norma hoje é de eficácia limitada, pois até o presente momento essa lei não foi editada. Analogicamente entende boa parte da doutrina trabalhista que pode-se aplicar a lei do direito de greve, aos servidores públicos já que todos devem ter o direito de protestar e lutar por melhores condições de vida e trabalho.

A greve é forma legítima e necessária de luta e também de protesto contra a opressão. A lei define os limites, os contornos que deve ter. Ao Judiciário caberá punir os excessos. Aos servidores públicos, entende-se ser legítimo, analogicamente, ou seja, de forma semelhante, exercer esse direito desde que respeitados os limites legais e os princípios democráticos, isso porque, a todos deve ser garantido o direito de lutar por um viver com mais dignidade, justiça e humanidade. Como dizia Martin Luther King: "o que mais preocupa não é o grito dos violentos, dos corruptos, dos sem caráter, dos sem ética. O que mais preocupa é o silêncio dos bons". 

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*Daniela Rodrigues Machado Vilela é advogada, professora universitária, mestre em Direito do Trabalho, pesquisadora e coordenadora discente de um Grupo de Estudos em Trabalho, Globalização e Economia, especialista em Direito do Trabalho pela UFMG em parceria com a Università Degli Studi di Roma Tor Vergata.

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