sexta-feira, 28 de abril de 2017

Quem é Jesus? A revelação da identidade de Jesus em Marcos

domtotal.com
Desde o início Jesus é uma figura que causa admiração em muitos, mas não se sabia direito como defini-lo.
É necessário caminhar com Jesus, como os discípulos fizeram, para que seja possível reconhecer nele o messias.
É necessário caminhar com Jesus, como os discípulos fizeram, para que seja possível reconhecer nele o messias. (Divulgação)
Por Rita Maria Gomes, NJ*

A pergunta sobre quem é Jesus continua atual. Ela surge no momento exato em que Jesus entra na cena pública, no meio de seu povo, como uma pessoa fora do comum. Mais precisamente, quando Jesus começa suas andanças pela Galileia e arredores falando com sabedoria e agindo com uma autoridade não encontrada nos homens “de religião” de sua época. Esse fato gerou a admiração de muitos que passaram a segui-lo, ainda que não soubessem bem a quem seguiam.

Muitas foram as tentativas de resposta, naquele tempo e na contemporaneidade. Escreve-se sobre Jesus nas diferentes áreas das ciências e cada abordagem tem o seu valor e nos aproximam dessa figura tão encantadora e surpreendente. Os primeiros ensaios de resposta que temos foram dadas pelos seguidores mais próximos de Jesus e estão consignadas nos Evangelhos.

O Evangelho [de Jesus Cristo] segundo Marcos nos diz quem é Jesus através de uma narrativa vivaz e colorida, orientada justamente pela interrogação “quem é este?” A primeira vez que Marcos levanta a questão sobre a identidade de Jesus não traz uma pergunta direta e sim indireta.

Em Mc 1,27, após ensinar na sinagoga de Cafarnaum e expulsar um espírito impuro, a audiência se pergunta: “O que é isso? Um ensinamento novo, e com autoridade: ele dá ordens até aos espíritos impuros, e eles lhe obedecem!” Em Mc 4,41, quando Jesus acalma a tempestade, seus discípulos espantados se perguntam: “Quem é este, a quem obedecem até o vento e o mar?”

Em Mc 6,1-6, as perguntas se multiplicam e começam as tentativas mais diversas para dar conta dessa personagem. Afinal quem é ele? Nesse trecho, Jesus estava ensinando na sinagoga de Nazaré e os presentes ali questionam: “De onde lhe vem isto? Que sabedoria é esta que lhe foi dada? E esses milagres (atos de poder) realizados por suas mãos? Não é ele o carpinteiro, o filho de Maria, irmão de Tiago, Joset, Judas e Simão? E suas irmãs não estão aqui conosco?” Assim, a primeira tentativa o liga à sua origem familiar e na linha do descrédito. Em Nazaré ele não pode realizar nenhum milagre por causa da incredulidade do povo.

Em 6,14-16, as possibilidade de resposta se alargam e a pessoa de Jesus recebe identificações com personagens da tradição profética. Uns dizem que é João Batista que ressuscitou dos mortos; outros dizem que ele é Elias; e ainda outros dizem que é um profeta como um dos antigos profetas. Herodes, após ouvir as opiniões, afirma: “Esse João, que eu mandei decapitar, ressuscitou”.

Em Mc 8,27-30, a última vez que a pergunta sobre a identidade de Jesus aparece no texto marcano, é feita pelo próprio Jesus e é dirigida aos discípulos: “Quem os homens dizem que eu sou?” A resposta é uma repetição quase idêntica à do texto de Herodes: João Batista, Elias ou um dos profetas. Em seguida, Jesus pergunta: “E vós, quem dizeis que eu sou?” A resposta agora vem de Pedro: “Tu és o Cristo”.

Há um crescendo na apresentação de Jesus através das relações dele com as outras personagens. Os primeiros a se questionarem é um grupo coletivo indistinto na sinagoga. Depois os discípulos, os conterrâneos de Jesus na sinagoga de Nazaré, a autoridade governante (Herodes) e, novamente os discípulos. No início, a pergunta não é nem mesmo sobre ele, mas a respeito de seu ensinamento com autoridade.

Desde o início Jesus é uma figura que causa admiração em muitos, mas não se sabia direito como defini-lo. O mais incrível é que, na narrativa marcana, as personagens transcendentes, ou seja, os espíritos impuros sabiam quem ele era a partir do momento mesmo em que faz sua aparição.

Assim, em Mc 1,24, o espírito impuro antes de ser expulso diz “eu sei quem tu és: o Santo de Deus!” Mais, em Mc 1,34, o texto diz que “ele curou a muitos e expulsou muitos demônios, e não lhes permita falar porque sabiam quem ele era”. Também em Mc 3,11, os espíritos impuros caem aos pés de Jesus gritando: “Tu és o Filho de Deus”.

A proibição aos espíritos impuros de declararem quem é Jesus está em função do leitor. A intenção da narrativa é levar o leitor de Marcos a fazer o caminho do reconhecimento de quem é Jesus. É no nível humano, terreno que a identidade de Jesus necessita ser esclarecida, conhecida e confessada e não no nível transcendente.

Sigamos em frente pois a resposta ainda não foi de todo dada, ou ao menos, não de forma satisfatória. Após a confissão de Pedro, “Tu és o Cristo” (8,29), Jesus não diz se ele está certo ou errado, embora saibamos ser acertada a resposta de Pedro porque o Evangelho abre com a afirmação “Evangelho de Jesus Cristo, filho de Deus” (Mc 1,1). Jesus simplesmente começa a anunciar sua paixão, morte e ressurreição. Um escândalo para os discípulos.

Jesus anuncia seu destino trágico três vezes (Mc 8,31; 9,31-32; 10,33-34) e em todas elas aparece o elemento da incompreensão. Era necessário superar a ideia nacionalista de um messias glorioso, vitorioso, conforme a ideia humana.

A glória e a vitória do Cristo se dá pelo caminho da cruz. Assim, para Marcos Jesus é o Messias: Filho do Homem crucificado e Filho de Deus ressuscitado. É aquele que padece as dores e morte humanas porque é humano mesmo sendo Filho de Deus. Jesus vence a morte ao morrer e ressuscitar. A morte não pôde detê-lo.

Por isso, é necessário caminhar com Jesus, como os discípulos fizeram, para que seja possível reconhecer nele o messias, o enviado de Deus que não corresponde às nossas expectativas, mas nos leva a conhecer e aceitar o projeto de Deus para o ser humano: ir ao encontro de Deus por seu Filho.

Leia também:

Evangelho de Marcos, hoje: a atualidade do conhecimento de Jesus

Evangelho de Marcos, um anúncio para o dia que se chama hoje!

A pedagogia da cruz

*Ir. Rita Maria Gomes, NJ, é doutora em Teologia, pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia.

Nenhum comentário:

Postar um comentário