domingo, 16 de abril de 2017

Páscoa e outras passagens

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Estamos todos necessitando, urgente e agudamente, de uma PÁSCOA que nos retire, enquanto humanidade, de caminhos tortuosos.
Proponho então uma parada para idealizarmos nossa páscoa.
Proponho então uma parada para idealizarmos nossa páscoa. (Reprodução)
Por Evaldo D´Assumpção*

Páscoa, imagino que quase todos sabem, é uma palavra derivada do latim Pascha, que por sua vez, deriva do hebraico Pessach / Pesach, que significa “a passagem”. Ela indica uma antiga festa realizada para celebrar a libertação do povo hebreu do cativeiro no Egito, aproximadamente em 1280 a.C.  Já para o cristianismo, a Páscoa celebra a ressurreição de Jesus Cristo, sua passagem da morte para a vida, encerrando-se com ela o período quaresmal.

Esta introdução serve apenas para ressaltar o sentido de “passagem” dessa festa, tanto na celebração judaica quanto na cristã. A primeira, ocorrida há mais de 3 mil anos, e a segunda, há dois mil anos. Passagens...

Aproveito essas reflexões para pensar os dias em que estamos vivendo. Se abro o jornal, as páginas estão repletas de notícias ruins, multiplicando-se os crimes no mais tenebroso cardápio: roubos, assassinatos, estupros, pedofilia, aborto, adultério, prostituição, corrupção, peculato, tráfico de drogas, de pessoas. Guerra, fome, doenças sem tratamento e mortes à míngua, crianças sem escola, jovens e adultos desempregados... O espaço torna-se pequeno para tanta miséria, e nem é meu desejo poluir mais ainda as mentes que buscam, na mídia, saber do mundo. Fico então me questionando: porque os diferentes meios de comunicação abrem tanto espaço para tais mazelas, e tão pouco para as coisas boas que, estou convicto, também existem e não são poucas? Sei que vão me dizer que aquelas são as matérias que mais atraem o público, e vendem jornais, revistas e programas.  Mas questiono: isso atrai o público, ou ao público impingiu-se esse universo imundo, como se somente ele existisse? E onde fica a função educadora dos meios de comunicação?

Questiono-me também a razão dos filmes e novelas, hoje repletos de libidinosidade, quase sempre em situações forçadas, totalmente desnecessárias para a narrativa que se faz, somente para explorar a sexualidade dos espectadores, muitos deles voyeristas patológicos que se comprazem, e até se saciam, com as cenas dispensáveis de nudismo e erotismo. E para completar o desregrado tempero, a violência explicitamente mostrada em níveis inimagináveis, com corpos dilacerados, sangue jorrando aos borbotões e sem necessidade, cidades inteiras sendo destruídas e com milhares de pessoas sendo soterradas, tudo numa falsa catarse que somente serve para alimentar novas violências.  

Pergunto-me por que nada se faz para mudar esse quadro, que a cada dia leva mais pessoas para crises depressivas, estabelece uma síndrome do medo que beira o pânico, levando pessoas a nem querer sair de casa. Será uma artimanha da sociedade capitalista consumista, que cria situações para fechar as pessoas em torno de equipamentos eletrônicos, os mais variados, capazes de lhes dar uma falsa felicidade pela diversão em ambiente fechado e seguro, e consequentemente ampliar a venda – e o lucro – com tais engenhocas?

Semana passada assisti com minha esposa, ambos encantados, o final de uma série de programas televisivos onde crianças se apresentavam numa disputa sadia pela seleção da melhor interpretação vocal musical. Foram dezenas de crianças e pré-adolescentes que levaram os telespectadores às lágrimas pela beleza de voz, de presença no palco, e especialmente por suas manifestações espontâneas, quando os resultados iam excluindo alguns e selecionando os melhores até se chegar ao vencedor final. Meninos e meninas deram uma verdadeira lição de humildade, solidariedade e até mesmo de espiritualidade. Lembrei-me da mesma série, porém revelando magníficos e novos cantores adultos, apresentada há tempos e em horário bastante tardio. Questionei-me por que programas como esses são apresentados, quase sempre, em horário pouco adequado para uma audiência familiar e de jovens, e que poderiam motivá-los ao bom e ao belo. Tão necessários nos dias atuais... Fiquei perguntando-me, por que os meios de comunicação não fazem uma PÁSCOA, passando do lado escuro das diversões para o grande público, para o lado realmente educativo, construtivo e respeitoso, contudo, sem cair no humorismo insipido e chulo – além de burro – tampouco na hipocrisia educacional, com verdadeiras aulas de sexualidade vulgar e descompromissada.

Estamos todos necessitando, urgente e agudamente, de uma PÁSCOA que nos retire, enquanto humanidade, de caminhos tortuosos, de moralismo hipócrita, do balaio de falsos valores trasvestidos de ideias libertárias, em que nos encontramos, para um mundo novo.

Proponho então uma parada para idealizarmos nossa PÁSCOA, questionando-nos, no mais fundo e sincero de nós mesmos, se somos mais felizes hoje, como estamos, ou se devemos fazer nossa PASSAGEM, não de retorno ao que se foi, mas para novos rumos, com nova e límpida visão da verdadeira felicidade para a qual somos predestinados.
*Evaldo D´Assumpção é médico e escritor

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