sexta-feira, 24 de março de 2017

Silêncio

Aprender o valor do silêncio que aproxima e esvazia a arrogância da pretensa sabedoria.


Meditar, respirar, alongar e preparar a travessia para outras margens de novos rios.
Meditar, respirar, alongar e preparar a travessia para outras margens de novos rios. (Divulgação)
Por Eleonora Santa Rosa*
Silêncio, por favor, pede o mestre Paulinho, em uma de suas mais belas composições, um verdadeiro samba1 mantra.
Em meio ao caos, ao excesso de tudo e todos, aos mil vaticínios e milhões de infortúnios, parar.
Hora de introspecção, recolhimento, reconexão.
Estancar o verbo, superar o ego e a baixa estima do lamento e resignação.
Meditar, respirar, alongar e preparar a travessia para outras margens de novos rios.
Desencravar o silêncio-ouro em meio aos ruídos de juízos e asseverações de sentenças sem fim.
Desencapar os fios da desolação, limpando a intoxicação das opiniões disparadas em torres de marfim.
Com o salvo conduto da conduta íntegra sobreviver a ser alvo constante e num lance de dados encontrar o acaso que salva e ilumina.
Segurar a língua, a palavra que fere, o impulso de imputar e deformar os outros.
Aprender o valor do silêncio que aproxima e esvazia a arrogância da pretensa sabedoria.
Acolher recolhendo julgamentos de interpretação e jugos de condenação, com ternura e  civilização.
Em tempos turvos de violência e desolação, desesperança e solidão, tristeza e insatisfação,  
pausar, interromper, interceptar a compulsão raivosa da destruição.
Sem medo, sem atropelo, ouvir, mesmo que ao longe, a poesia do samba que salva e cicatriza os cortes das palavras mal ditas no dia a dia:
“Silêncio, por favor
Enquanto esqueço um pouco
a dor no peito
Não diga nada
sobre meus defeitos
Eu não me lembro mais
quem me deixou assim
Hoje eu quero apenas
Uma pausa de mil compassos
Para ver as meninas
E nada mais nos braços
Só este amor
assim descontraído
Quem sabe de tudo não fale
Quem não sabe nada se cale
Se for preciso eu repito
Porque hoje eu vou fazer
Ao meu jeito eu vou fazer
Um samba sobre o infinito”.
 
1 - Samba para ver as meninas – Paulinho da Viola
*Eleonora Santa Rosa - jornalista, produtora, gestora e consultora, foi secretária de Estado da Cultura de Minas Gerais. É diretora do Santa Rosa Bureau Cultural.

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