quinta-feira, 16 de março de 2017

Religiosos do Brasil posicionam-se contra a reforma da Previdência

domtotal.com

Presidência da Conferência dos Religiosos do Brasil apontou vários abusos na proposta do governo, entre eles, o fim da filantropia no Brasil.
Franciscanos se manifestam contra a Reforma da Previdencia durante o encontro nacional da ordem.
Franciscanos se manifestam contra a Reforma da Previdencia durante o encontro nacional da ordem. 
(Frei Orestes Serra)
Atualizada às 18h21

A Conferência dos Religiosos do Brasil (CRB) elaborou uma carta aberta convocando todos os religiosos e religiosas, colaboradores, e pessoas atendidas pelas unidades sociais, escolas e universidades, hospitais, centros de atendimentos para mobilizarem-se contra a Reforma da Previdência (PEC 287/2016), que também visa extinguir o direito à Filantropia a que muitas instituições beneficentes e de caridade tem direito. O documento aponta ainda que cristãos e religiosos devem aguçar o senso crítico para não legitimar posições assumidas que vão contra o Evangelho e os direitos dos mais pobres.

Somando-se à presidência da conferência, diversas congregações religiosas se posicionaram contra. Muitos religiosos estão participando dos protestos e outros, além disso, publicaram notas de repúdio, como o fizeram os superiores dos jesuitas (Companhia de Jesus) e dos franciscanos (Ordem dos frades menores) no Brasil . Religiosos entendem que a luta pelos direitos dos mais pobres faz parte da realização do Reino de Deus no mundo.

Leia a íntegra da carta da presidencia da CRB :  

Brasília, DF, 08 de março de 2017

“Felizes sois vós quando vos insultam e perseguem e mentindo dizem contra vós toda espécie de mal por minha causa. Alegrai-vos e regozijai-vos”. (Mt 5,11)

Queridas Religiosas e Queridos religiosos!

É em nome pessoal e em nome da CRB Nacional, que representa mais de 35 mil religiosos e religiosas, que lhes escrevo. Faço-o com o coração entristecido por, mais uma vez, ver os interesses de poucos solaparem os direitos de muitos, especialmente das crianças e jovens mais pobres e vulneráveis. Literalmente querem nos tirar as migalhas.

Pessoas com passado não muito transparente se sentem no direito de legislar e de impor suas ideias, valendo-se do cargo que ocupam como representantes do povo. Como cristãos e como religiosos devemos aguçar o nosso senso crítico para não legitimar posições assumidas que vão contra o Evangelho e os direitos dos mais pobres. 

Nos próximos dias estará sendo discutida, e talvez votada, por nosso parlamento, a Reforma da Previdência, na qual o Governo Federal busca alterar a Constituição Federal por meio de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) n° 287/2016. Além de outros absurdos, no bojo dessa reforma, nossos representantes querem extinguir o direito à Filantropia a que muitas instituições beneficentes e de caridade tem direito. Trata-se de um dos efeitos colaterais de contornos imprevisíveis que tal emenda produzirá contra os pobres dessa nação no presente e no futuro.

O deputado federal Arthur Maia (PPS-BA), relator da proposta, tem se pronunciado categoricamente contra as desonerações fiscais em favor de alguns setores da sociedade, em especial das instituições filantrópicas. Chegou ao ponto de apelar à difamação pública dessas instituições centenárias, imputando-lhe adjetivos como: “pilantropia”, “pouca vergonha” e “aberração” no infeliz intuito de desqualificar a imunidade tributária das entidades beneficentes e de assistência social. É triste ver nas redes sociais anúncios do PMDB afirmando: “Se a reforma da previdência não sair – Adeus Bolsa Família – Adeus FIES ...”.

Uma campanha bem ao estilo autoritário e segundo a ética de quem a patrocina e, quem sabe, a financia. O cronograma de tramitação dessa matéria no Congresso Nacional é extremamente curto. Já nos próximos dias, por volta do dia 22/03/2017, deverá ser votada na Plenária da

Câmara. O atual domínio da bancada do Governo certamente garantirá a aprovação sem o menor esforço, pouco se lixando com as consequências de tal decisão. O que importa é arrecadar mais impostos.

A única forma de mudarmos esse triste panorama é o engajamento de todos: lideranças, religiosos/as, colaboradores, atendidos das nossas unidades sociais, escolas e universidades, hospitais, centros de atendimentos. Ou nós nos mobilizamos e defendemos o direito das nossas instituições e dos pobres, ou mais uma vez pagaremos a conta dos desmandos palacianos.

Permitam-me oferecer-vos alguns dados e ilustrações para melhor compreensão da gravidade do assunto:  

• Pesquisa do Fórum Nacional das Instituições Filantrópicas - FONIF, realizada a partir de dados oficiais fornecidos pela própria Administração Pública, revela que as entidades imunes proporcionam um retorno social da ordem de 5,92 x 1. Isto é, para cada R$ 1,00 não cobrado em tributos, R$ 5,92 são convertidos em benefício da população, na forma de serviços, empregos, infraestrutura, qualidade de vida e conhecimento. Ou seja: se o governo tirar a filantropia das instituições que prestam esses serviços, ele terá que arcar com a assistência a essas pessoas, gastando 5,92 vezes mais do que arrecada para dar o atendimento necessário. Como percebemos, essa decisão é pouco inteligente e incidirá diretamente na queda ou desqualificação do atendimento dos mais necessitados. 

• As isenções das entidades filantrópicas correspondem a apenas 3% da arrecadação total da Previdência Social, de modo que a suspensão de tal isenção não vai solucionar o problema. A devolução do dinheiro desviado no “propinoduto” daria muito mais resultado financeiro do que terminar com as filantrópicas; 

• Caso as entidades filantrópicas percam esse incentivo, centenas ou milhares de escolas, hospitais, universidades, centros sociais, centros de atendimentos a vulneráveis pertencentes a estas instituições deverão fechar as portas. Milhões de pessoas serão privadas de atendimento digno e humanitário nas unidades atendidas pelas filantrópicas e passarão para a rede pública, já incapaz de oferecer ao nosso povo o mínimo em saúde e educação. 

• A consequência de curto prazo, será o aumento de crianças e adolescentes vivendo na rua, com muita possibilidade de futuramente assaltarem os que hoje lhe negam um tratamento digno. E então, a economia feita hoje, será insuficiente para construir prisões para abrigar os infratores produzidos pelo abandono produzido por tal decisão. Uma pena que a maioria dos nossos políticos não consigam ver além da próxima eleição. 

Irmãos e Irmãs, precisamos mobilizar as nossas instituições! Precisamos defender os nossos direitos e os direitos dos pobres e vulneráveis! Não se trata de luta ideológica, mas de posicionamento evangélico. 

Como ação prática, sugiro que enviem centenas, milhares, milhões de e-mails, aos deputados e senadores. Usemos as redes sociais para denunciar mais esse abuso de poder econômico e político de poucos que marginaliza quem trabalhou com seriedade durante séculos em favor dos necessitados. Participemos de manifestações públicas com esse objetivo. 

Alertemos os nossos atendidos, alunos, enfermos, sobre esse perigo e peçamos a eles que se manifestem nas redes sociais contra esse “assalto” a dignidade das instituições e das pessoas.

Não poupemos nenhum esforço no sentido de esclarecer e de influir na decisão dos nossos representantes em Brasília. 

Termino pedindo a todos os religiosos e religiosas, especialmente aos anciãos, aos enfermos e aos de clausura, que rezem fervorosamente a Deus, para que o Espírito Santo ilumine as mentes e os corações dos que devem decidir nosso futuro. Se Deus ouviu o clamor de Israel quando o Faraó escravizou o seu povo, certamente nos ouvirá também. Ele é Pai e Mãe e cuidará de nós e dos pobres do mundo. Recordo o Evangelho: “Existem certos demônios que só são expulsos mediante muita oração” (Mt 17,21). Quem sabe, estejamos diante de um deles.

Que o Deus bondoso tenha para nosso país olhos de misericórdia e nos conduza pelos caminhos da justiça e da fraternidade. Que a Virgem de Aparecida nos proteja e nos abençoe.

Em união de preces 

IR. MARIA INÊS VIEIRA RIBEIRO
Presidente da CRB Nacional

Leia a íntegra da carta do superior dos Jesuítas:

Reunidos em São Leopoldo (RS) para o Fórum de Gestão Apostólica, o Provincial dos Jesuítas do Brasil, Superiores e seus auxiliares diretos acompanham com preocupação e esperança este dia de mobilização nacional contra a reforma da Previdência Social, proposta pelo governo e que ora tramita no Congresso Nacional.

Se por um lado há preocupação pelos prejuízos que esta reforma, caso seja aprovada, trará aos direitos dos trabalhadores e aposentados e à população mais pobre de nosso país, inclusive limitando a filantropia realizada em inúmeros programas e obras sociais mantidos pelas dioceses, ordens e congregações religiosas. Por outro lado, há esperança de que mobilizações como a de hoje ajudem a sensibilizar os nossos governantes e congressistas a rever seus posicionamentos e a pensar, acima de tudo, no bem dos brasileiros, seguindo a opção preferencial que Nosso Senhor Jesus Cristo teve e nos chama a ter pelos mais excluídos e marginalizados.

São Leopoldo, 15 de março de 2017

João Renato Eidt, SJ
Provincial dos Jesuítas do Brasil

Leia a íntegra da carta dos Frandes Menores (Franciscanos):  

“A cabeça pensa a partir de onde os pés pisam”, Frei Betto.

Neste dia 15 de março, em que diversas organizações brasileiras propõem uma greve geral em protesto contra a Reforma da Previdência, em nome de meus confrades e do Povo de Deus junto a quem realizamos a missão evangelizadora em nosso território provincial, não me resta outra postura a não ser a de um posicionamento frontalmente contrário à Reforma da Previdência Social proposta pela Proposta de Emenda à Constituição (PEC 287/2016), especialmente no que diz respeito ao aumento do tempo mínimo de contribuição para 49 anos e da idade mínima para 65 anos.

Para sustentar meu posicionamento, não lanço mão de argumentos baseados na economia, na matemática e na administração, pois não tenho conhecimento o suficiente nestas áreas. No entanto, baseado na realidade que nossos confrades encontram nos ambientes onde vivem e convivem e no compromisso com a Justiça, exigência irrenunciável do Evangelho, afirmo com convicção que esta proposta é um verdadeiro ato de covardia com os mais pobres.

Basta olharmos para a luta diária de nossos irmãos agricultores, especialmente nas áreas rurais em que estamos presentes nos estados do PR (especialmente a Região Sudoeste), SC (Alto Vale do Itajaí, Planalto Central e Oeste) e ES (especialmente a região de Colatina), ou para a dureza da vida dos operários nas periferias urbanas do Rio de Janeiro (Baixada Fluminense) e São Paulo para percebermos o grau de insanidade presente em exigir que estes trabalhadores braçais se desdobrem em quase 50 anos de trabalho para, depois, receberem migalhas que mal custeiam os remédios que se fazem necessários depois de uma vida de trabalho intenso e extenuante.

A quem beneficia iniciativas dessa natureza? Por que não apostarmos em estratégias mais distributivas e justas? Por que, para uma minoria privilegiada, um sem-número de privilégios e, para a grande massa da população, a dureza de explicações pautadas em argumentos  frios e desumanos, baseados na aridez dos números?

São perguntas a que nossos dirigentes não podem se furtar em responder. Permaneçamos firmes, cada um dentro de suas possibilidades, para lutarmos com todas as forças a fim de que nosso Brasil seja de fato um lugar de justiça e de paz para todos.

Com estima fraterna, e com apoio de meu Definitório Provincial, deixo minhas saudações, rogando a Deus por um tempo de maior senso de humanidade em nosso país.

 Frei Fidêncio Vanboemmel, OFM
Ministro Provincial da Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil


CNBB/ Franciscanos/ Dom Total/ Jesuítas Brasil

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