segunda-feira, 20 de março de 2017

Religião bate à porta das aulas de ciências nos EUA

domtotal.com
Parlamentares do Texas analisam projeto de lei que protegeria professores que questionem teorias científicas consideradas 'polêmicas'.
Segundo uma pesquisa do Gallup de 2014, mais de um em cada três americanos (42%) acredita na teoria do criacionismo
Segundo uma pesquisa do Gallup de 2014, mais de um em cada três americanos (42%) acredita
 na teoria do criacionismo (AFP)

Todos os anos, quando Angela Garlington aborda a origem da Terra em sua aula de ciências no ensino médio de um colégio público do Texas, menciona, entre outras teorias, a do criacionismo, segundo a qual toda a vida no nosso planeta foi criada por Deus.

"Eu digo simplesmente aos meus alunos que, como jovens adultos educados, têm direito a escolher em que acreditam", explica esta professora de Odessa, uma cidade cuja economia gira em torno do petróleo.

Esta postura, teoricamente, poderia implicá-la em ações judiciais. Mas os parlamentares do Texas estão analisando, justamente, um projeto de lei apresentado em fevereiro que protegeria os professores, como Garlington, que questionem as teorias científicas consideradas "polêmicas".

Texas é um dois oito estados dos Estados Unidos (em um total de 50) onde estas leis foram apresentadas desde o começo do ano, junto com Alabama, Arkansas, Dakota do Sul, Flórida, Indiana, Iowa e Oklahoma.

O debate está presente há décadas nos Estados Unidos: a religião deve entrar nas aulas de ciências?

Segundo uma pesquisa do Gallup de 2014, mais de um em cada três americanos (42%) acredita na teoria do criacionismo, segundo a qual Deus criou os humanos em sua forma atual há cerca de 10.000 anos.

- "Mas você não acredita em Deus?" -

A batalha entre a teoria da evolução e a do criacionismo é particularmente forte no sudoeste conservador do Texas.

Em um colégio da pequena cidade de Stanton, dedicada ao cultivo de algodão, a 45 minutos de Odessa, Kimberly Villanueva quer equilibrar a balança.

"Tive alunos no ano passado que se levantaram e saíram da sala de aula quando falamos sobre a tectônica e a evolução", contou a professora, lembrando que lhe perguntaram: "Mas você não acredita em Deus?".

Segundo a legislação atual, Villanueva não está autorizada a responder esta pergunta ou a defender sua posição.

Mas, se o projeto de lei apresentado no Texas for aprovado, ela acredita que finalmente poderá dar continuidade a esta conversa e talvez conseguir "abrir também estas mentes para as possibilidades científicas".

Muitas batalhas judiciais marcaram décadas de luta em torno ao ensino do criacionismo nas escolas americanas.

Com a nova legislação proposta, explicam seus defensores, as disputas jurídicas seriam evitadas, porque os professores teriam a opção de mencionar teorias religiosas nas aulas de ciências, embora sem estar obrigados a isso.

- Setenta propostas legislativas -

Mas os que se opõem a estas iniciativas, tanto no Texas como em outros lugares, acreditam que o que elas buscam é eliminar a separação entre a Igreja e o Estado, consagrada na Constituição dos Estados Unidos.

"Desde 2004, quando a primeira destas leis apareceu no Alabama, tivemos cerca de 70 em todo o país", disse Glenn Branch, diretor adjunto do Centro Nacional para a Educação Científica, organização contrária à introdução da religião nas aulas de ciências.

Luisiana aprovou uma legislação assim em 2008, e Tennessee em 2012. No entanto, nos estados conservadores de Dakota do Sul e Iowa, os parlamentares bloquearam neste ano outras iniciativas similares.

Através de cartas e contatos com os legisladores, pessoas como David Evans, diretor-executivo da Associação Nacional de Professores de Ciências dos Estados Unidos, foram essenciais para que esta iniciativa fosse descartada em Dakota do Sul.

"Somos defensores fervorosos do ensino das ciências nas aulas de ciências e somos profundamente contra o ensino de qualquer outra coisa nas aulas de ciências", afirma.

Angela Garlington assegura que nunca teve problemas por ter misturado ciência e religião nas suas aulas no Texas.

"Não sei se meus colegas abordam os diferentes pontos de vista sobre um tema polêmico, mas eu sempre fiz isso e sem dúvida continuarei fazendo", aponta.


AFP

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